quarta-feira, 13 de abril de 2011

A Noite I

15
Queria viajar para Ocidente.
Não suportava a noite.
Há poucas semanas,
tinha sido apanhado desprevenido
por uma daquelas noites transparentes.
Fora uma noite sem máscaras.
Queria viajar para Ocidente, atrás do Sol,
manter o compromisso do fim de tarde eterno
onde tudo se mistura, flui, difuso e imaterial.
Não aguentaria outra noite
de desenho puro e lancinante das coisas.
Sabia do risco de dizer palavras definitivas.
Começou a correr com o Sol quase no ocaso.
Ainda conseguiu agarrar os últimos rosas
e violetas pendurados nos telhados baixos.
Atravessou as derradeiras estradas de nevoeiro
a transbordar de compromissos com o dia
que se desfazia lentamente, na miragem da estação de comboios.
Pensou que a Ocidente poderia ser possível
escapar ao desenho puro do corpo.
Correu pela plataforma em passos de pouca-terra e
ergueu-se no botão automático da porta sopro.
Havia um lugar à janela de onde contemplou o Sol oblíquo, quieto num infindável crepúsculo.
Corriam árvores e raras casas no ecrã, montanhas e nuvens.
Não se fazia noite e a calma desceu-lhe pelos ombros.
Muitas horas depois, numa estação da montanha,
subiu uma mulher de gorro azul.

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